Clonagem de seres humanos
Dr. Joaquim Domingos Soares
O tema além de controverso é polêmico. O cientista através da curiosidade impulsiona o conhecimento e a investigação, no entanto, a curiosidade não pode vir isoladamente sem a ética. A clonagem de um ser por inteiro é considerado como um atentado aos direitos humanos, à moral e à liberdade. Os cientistas quando estão estudando um problema adentram em um túnel dentro do qual perdem a visão do todo. O cientista quer saber se o experimento funciona, etc. Mas tem que questionar criticamente onde suas investigações estão conduzindo, quais são as implicações que esses novos conhecimentos trazem e para onde estão nos conduzindo. Historicamente os valores humanos e a ética não foram capazes de sustar o desenvolvimento da ciência. Por outro lado, o universo humano é distinto em suas propriedades singulares quando comparado ao mundo natural, muito embora o homem esteja, por muitos aspectos, inserido na natureza. O que diferencia assim tão distintamente e acentuadamente o universo humano do mundo natural é o valor, e por isto a ética que trata do domínio dos juizos de valor, e implicam em moral e capacidade de escolher além de considerar diversos outros aspectos antropológicos e culturais. Uma das distinções que se costuma, fazer para separar o conhecimento e a moral, é considerar que os juizos que o emite estão na ordem do "ser", e, os juizos propriamente morais na ordem do "dever ser".
Na Inglaterra, há 10 anos atrás, a lei da Fertilização Humana e da Embriologia não permitia a clonagem humana e, nem pesquisas em células tronco (células-mãe). Permitia-se, unicamente a clonagem de embriões com até 14 dias para pesquisas em busca de soluções para a esterilidade. E, no ano de 2000, o governo americano adotou postura distinta, tirou do orçamento verbas para pesquisas em embriões.
O Legislativo Britânico (Casa dos Comuns) passou no final de 2000 a normatizar favoravelmente e a autorizar pesquisas que se utilizavam de células-mãe no desenvolvimento de tratamentos para diversas doenças, tais como Parkinson, Leucemia e outras formas de câncer. No início de 2001, a Casa dos Lordes aprovou legislação que autorizava a clonagem limitada de células embrionárias humanas mas ainda mantendo ilegal a clonagem humana. Mesmo que o Ministério da Saúde da Grã-Bretanha, tenha garantido que "legalmente" nunca permitiria que a clonagem humana "in totun" acontecesse, não é este "o primeiro passo para a clonagem "in totum" de seres humanos? Mesmo assim a possibilidade de clonagem humana parcial, com vistas a obter órgãos para transplantes, é extremamente polêmica.
Células-mãe são as que, durante o processo de embriogênese, transformam-se em diferentes tipos de células e, por isso, pela sua pluripotencialidade, podem originar diferentes partes do corpo (tecidos, órgãos, etc), por exemplo, células do sangue, neurônios, células vasculares (endotélios) e outras. Assim, na clonagem uma célula retirada de um doador, é fertilizada em laboratório e ao crescer e multiplicar-se durante 5 dias, dá origem a cerca de 100 "células-suporte" que tem o potencial de se transformar em qualquer tipo de célula do corpo, podendo ser usadas com fins terapêuticos, pois são células toleradas pelo sistema imunológico ("células amigas") e não como estranhas ("inimigas"), o que permitiria evitar a rejeição tão comum nos órgãos transplantados.
As células-mãe ou tronco podem ser obtidas tanto de adultos quanto de embriões, mas são as embrionárias (de embriões) de menos de 5 dias de vida que oferecem maior potencial de benefício para os seres humanos, como argumentam os pesquisadores. Uma alternativa muito promissora são as células do cordão umbilical do embrião "in vivo" que podem ser extraídas sem dano para o mesmo e para a mãe.
Mais uma vez, diante do fato concreto da clonagem de seres humanos, encontramo-nos diante de um impasse histórico, sabendo-se que a cultura "por mais que tenha tentado, não tem conseguido impedir o "progresso da ciência". Nesta dicotomia onde a sociedade, por um lado, é o espaço contextual da experimentação para alguns e um "campo de jogo" para outros! Resta-nos estabelecer as regras, e para essas são essenciais os juízos de valor que embasam a bioética. Dentro do pluralismo ético, respeitando-se o principialismo (Beauchamp e Childress) que apresenta quatro princípios básicos: o princípio do respeito à autonomia (a decisão depender do paciente ou centra-se nele); o princípio da não-maleficiência; o princípio da beneficência e o princípio da justiça, todos convergindo ao respeito à vida.
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